Escolas norteamericanas se juntam para transformar o jornalismo
Entre as principais iniciativas, um novo site laboratório para que os estudantes experimentem novos jeitos de contar histórias
Por Marcela Gonsalves
Os primeiros resultados da parceria entre o Carnegie Institute e a Fundação Knight, instituições americanas que se uniram em 2005 em um projeto para melhorar as perspectivas do futuro da educação em jornalismo, foram divulgados oficialmente em agosto de 2011, seis anos e cerca de US$ 19,7 milhões depois do lançamento oficial da ideia. O balanço da experiência traz boas lições para quem investiga os caminhos do ensino de jornalismo.
Batizado de Carnegie-Knight Initiative on the Future of Journalism Education, o projeto envolveu 11 entre as escolas de jornalismo mais tradicionais do país, que oferecem cursos de graduação e pós-graduação, além do Centro de Estudos Joan Shorenstein, da Universidade de Harvard – clique aqui para ver a lista completa das instituições. O objetivo geral foi modernizar o programa de ensino dessas instituições de acordo com a identidade de cada uma. Embora concorrentes, elas conseguiram se unir para alcançar objetivos comuns.
A iniciativa nasceu do pressuposto de que as escolas de jornalismo americanas não estavam cumprindo seu papel de formar profissionais bem treinados e informados, e foi influenciada por uma pesquisa conduzida pela consultoria McKinsey em 2004. A empresa realizou 40 entrevistas com novos lideres na área de jornalismo, através das quais constatou uma crise de confiança da profissão, e que as escolas de jornalismo não estavam fornecendo respostas para essa crise. Segundo o relatório, estava claro que as faculdades estavam desatualizadas e, em muitos casos, exerciam um papel marginal dentro das universidades.
As discussões iniciais foram feitas com quatro das principais faculdades de jornalismo no país: Berkeley Graduate School of Journalism, na Universidade da Califórnia, Graduate School of Journalism, na Universidade de Columbia, Medill School of Journalism, na Universidade Northwestern, e na Annenberg School for Communication & Journalism, na Universidade de Califórnia do Sul. Nos anos seguintes, outras sete se integraram ao projeto.
Iniciativas
O Carnegie-Knight Initiative on the Future of Journalism Education foi lançado com base em três pontos principais: revisão dos currículos das escolas parceiras, criação do News21 — um programa para produção anual de reportagens feitas pelos estudantes, nas plataformas de mídia disponíveis, sob supervisão dos docentes –, e criação de uma plataforma para debate entre os profissionais educadores, batizada de Journalist’s Resource.
A reforma curricular não ficou apenas no papel e foi, de fato, colocada em prática. Mas a iniciativa que melhor reuniu as instituições e se aproximou da prática do jornalismo foi o News21, apelido para News for the 21st Century: Incubators of New Ideas (Notícias para o século 21: Incubadoras de novas ideias). O nome já diz bastante sobre o projeto, um laboratório onde os estudantes deveriam produzir matérias relevantes, veiculando-as de maneira a romper com os moldes da mídia tradicional. A iniciativa buscava, assim, reforçar os princípios consolidados do jornalismo como conseguir histórias inéditas, fazer uma boa apuração e organizar as informações, ao mesmo tempo em que estimulava um novo modo de contar essas histórias com as ferramentas da era da tecnologia.
O News21
Financiado com US$7,5 mlhões da Fundação Knight, o objetivo do programa, inserido na visão geral do projeto de revitalizar as escolas de jornalismo, era fazer com que os alunos colocassem a mão na massa e mostrar na prática o que as instituições conseguiriam oferecer em termos de conteúdo e inovação. Além de ajudar na formação dos jornalistas, poderia oferecer novas ideias e estratégias para uma profissão em crise.
Uma fala aos participantes do reitor da Escola de Jornalismo Walter Cronkite, da Universidade do Arizona, ilustra o espírito do News21: “Se o que vocês conseguirem no final do verão for produzir histórias fantásticas que são realmente interessantes e realmente importantes e realmente relevantes, e que nunca foram contadas antes, e se vocês conseguirem publicá-las no Washington Post, no The New York Times, ou no Los Angeles Times, se isso for o que vocês conseguirem nesse verão, nós falhamos. Nós falhamos miseravelmente. O News21 precisa ir muito além disso”.
Algumas matérias produzidas dentro do projeto chegaram a ser publicadas em veículos tradicionais como o Washington Post e o site MSNBC.com. Mas quanto mais ele avançava em relação à inovação, mais complicado isso ficava. Um depoimento de Bob Calo ao repórter Christopher Connell explica o porquê. Conferencista de Berkeley e diretor do programa em 2008, Calo afirma: “quanto maior o comprometimento que você tem com a inovação, mais difícil é distribuir muitas histórias, porque você deixa de produzir unidade tradicionais de conteúdo informativo”. Para ele, contudo, era mais importante dentro do News21 continuar produzindo um conteúdo integrado do que inserir o trabalho dos alunos na mídia tradicional.
Os estudantes de jornalismo das escolas associadas são selecionados e ganham uma bolsa para participar do programa. Durante 10 semanas, eles apuram e produzem reportagens a respeito de um tema pré-determinado, sobre o qual já se debruçaram nos meses anteriores através de pesquisa e coleta de informações. Durante a elaboração do material, os alunos são acompanhados por professores, editores profissionais e web designers.
No início de 2011, a Fundação Knight decidiu contratar consultores do grupo JM para avaliar o impacto do programa. Segundo o divulgado no relatório, os estudantes trabalharam com jornalismo de profundidade e produziram inovação significante na maneira de contar histórias, no design, interatividade e apresentação de dados. Dos 318 pós-graduandos que participaram do projeto até a data da pesquisa, 241 estavam empregados na área de mídia e comunicação, e a taxa de contratação entre os participantes foi maior do que a média dos Estados Unidos. Além disso, a pesquisa constatou que as principais empresas estavam contratando mais estudantes recém-formados para ocupar cargos criados pela internet.
Esses, porém, são apenas alguns dados pontuais. Não é possível determinar exatamente o alcance das inovações do News21. O que o novo estudo feito pela JM em 2011 constatou é que tanto as instituições de ensino quanto os alunos que participaram do projeto ficaram satisfeitos com os resultados alcançados, apesar de alguns pontos poderem ser melhorados. E o fato de que em 2012 a experiência do News21 será expandida para todas as escolas de jornalismo norteamericanas diz um pouco sobre o sucesso do programa.
Dados referentes às 318 pessoas que participaram do projeto de 2006 a 2010, publicados em agosto de 2010 no News 21 Grant Report.