Estudantes de jornalismo sofrem com busca por estágios e inserção no mercado laboral
Alunos podem trabalhar a partir do terceiro ano, mas situação se torna cada vez mais difícil com a crise econômica
Por Alice Agnelli
Em 2010, 2.826 alunos do ensino superior espanhol terminaram seus estudos de jornalismo. 2.000 deles se formaram em universidades públicas – sendo a Complutense de Madri a que teve a maior quantidade de alunos (509). Os outros 826 receberam o diploma de universidades privadas. Veja a tabela abaixo:
ALUNOS FORMADOS EM 2010
Universidades Espanholas | Total de Alunos | |
Autónoma de Barcelona | 266 | |
Carlos III | 87 | |
Complutense de Madrid | 509 | |
Illes Balears | 29 | |
Málaga | 90 | |
Miguel Hernández de Elche | 23 | |
Murcia | 83 | |
Universidades Públicas | Pompeu Fabra | 66 |
Rey Juan Carlos | 136 | |
Rovira i Virgili | 42 | |
Santiago de Compostela | 90 | |
Sevilla | 254 | |
Valencia (Est. General) | 69 | |
Valladolid | 87 | |
Outras não identificadas | 169 | |
Abat Oliba-CEU | 4 | |
Antonio de Nebrija | 20 | |
Camilo José Cela | 13 | |
Cardenal Herrera-CEU | 111 | |
Católica S. Antonio de Murcia | 36 | |
Europea Miguel de Cervantes | 22 | |
Europea de Madrid | 56 | |
Universidades Privadas | Francisco de Vitoria | 44 |
IE Universidad | 15 | |
Internal. de Catalunya | 24 | |
Navarra | 70 | |
Pontificia de Salamanca | 121 | |
Ramón Llull | 104 | |
San Jorge | 62 | |
San Pablo-CEU | 93 | |
Vic | 31 | |
TOTAL | 2826 |
FONTE: INE
Ao analisar a localização geográfica das universidades de jornalismo da Espanha, percebe-se que grande parte encontra-se nas principais cidades espanholas: Madri, a capital; e, Barcelona, pólo econômico do país. Confira abaixo quais são:
Madrid | Barcelona |
Rey Juan Carlos | Pompeu Fabra |
Complutense de Madrid | Abat Oliba-CEU |
Antonio de Nebrija | Internal. de Catalunya |
Camilo José Cela | Ramón Llull |
Europea de Madrid | |
Francisco de Vitoria | |
IE Universidad | |
San Pablo-CEU |
FONTE: INE
Por serem os pólos político e econômico do país, supõe-se que neles se concentra uma maior oferta de trabalho. De fato, segundo dados de 2011 do Infoempleo, juntas Madri e Barcelona representam quase 40% da distribuição da oferta de trabalho da Espanha:
Madri | Barcelona | |
2010 | 18,79 | 18,44 |
2009 | 18,44 | 16,71 |
FONTE: INE
Na área de jornalismo, a hipótese é de que isso se mantenha, já que as sedes das grandes empresas de comunicação se concentram nessas cidades. Com isso, é de se imaginar que a maioria dos alunos de jornalismo possui facilidade para ingressar no mercado enquanto realizam seus estudos. Certo? Errado.
Na Espanha, poucos são os estudantes que efetivamente realizam estágios durante o curso acadêmico. Quando estive estudando no país, surpreendeu-me a quantidade de alunos que não trabalhavam durante a graduação. Alguns começavam com trabalhos na própria faculdade – como nas bibliotecas – e seguiam para outras instituições conforme se aproximam das etapas finais da graduação. No entanto, a crise econômica pela qual passa o país vem afetando o ingresso desses jovens ao mercado laboral e diminuindo cada vez mais a chance de arranjar um emprego durante a graduação.
Para aprender a prática
Se por um lado, a implantação do Plano de Bolonha favorece a preparação mercadológica dos estudantes, pois ele se baseia na formação profissional do universitário; por outro, ainda faltam aulas práticas para que eles estejam de fato preparados – já que o mercado não consegue suprir essa demanda oferecendo estágios. Segundo o Livro Branco (Aneca, 2004), 56% dos alunos concordam que disciplinas práticas estão entre as mais importantes – mas que, ao mesmo tempo, estão entre as que enfrentam maiores problemas.
Francisco Caro e Gloria Jiménez, professores da Universidade de Sevilla, problematizam a situação dos estudantes de jornalismo em seu artigo Jornalistas: o acesso ao mercado laboral. Para eles, há um confronto entre os objetivos acadêmicos e profissionais: “As universidades buscam formar pessoas com conhecimentos profissionais que contribuam ao crescimento da sociedade, formam pessoas com espírito critico”, contam os professores, “por outro lado, o mundo empresarial exige máquinas intelectuais que aumentem a produtividade com pouco investimento”.
No entanto, em 2001, um estudo divulgado pela empresa de consultoria de recursos humanos “Circulo de Progreso”, mostrou o contrário. A carreira com maior potencial de inserção laboral era jornalismo. Ele apontou que 41,42% das ofertas para jornalistas não exigiam experiência anterior, o que facilitava a entrada. Se por um lado, isso permite o acesso à profissão aos alunos, por outro, precariza as condições trabalhistas, já que firmam-se contratos temporais ou de “bolsistas” que se prolongam por muitos anos.
Os professores Caro e Glória explicam que apesar da inserção ao mercado laboral parecer ser mais fácil, a permanência nele é difícil, assim como a qualidade do trabalho. Para eles, é comum que estudantes de jornalismo sejam contratados para suprir as tarefas que deveriam ser realizadas por profissionais. Com uma diferença: muitas vezes eles não são remunerados e, se o são, os salários costumam ser baixíssimos.
Pilar Pelares, aluna de jornalismo da Universidade Carlos III, conta que há casos em que o estudante recebe uma “bolsa” de 300 euros para trabalhar oito horas por dia. “Isso, em Madri, chega a ser praticamente a metade de seus gastos mensais”, reclama.
Diretrizes para os estágios
Em 2003, a Conferência de Decanos de Faculdades de Ciências da Comunicação aprovou por unanimidade a Proposta de dez pontos para harmonizar as práticas externas dos alunos das Faculdades de Ciências da Comunicação e da Informação, um documento que reúne as diretrizes para os estágios.
Entre os pontos, foi decidido que as práticas deveriam durar, no máximo, quatro meses, e que seriam não-obrigatórias, com no máximo 25 horas de trabalho por semana. A bolsa oferecida ao aluno fica a critério do empregador, sendo que a prática pode ou não ser remunerada. O número de profissionais deve ser superior ao dos estagiários, que devem seguir um “Plano de Formação” autorizado pela faculdade. Ainda na proposta, considera-se que o período para realizações dos estágios se restrinja ao segundo ciclo, ou seja, a partir do terceiro ano.
A Federação de Sindicatos dos Jornalistas da Espanha (FeSP) também estabeleceu alguns critérios sobre as práticas dos estudantes nas empresas. O Criterios da FeSP sobre as prácticas dos estudantes nas empresas foi publicado em outubro de 2004. Ele tem o objetivo de “por fim ao abuso contra estagiários por parte das empresas”, e, para isso, pede um consenso entre alunos, empresas e faculdades. “A utilização das práticas de estudantes de jornalismo em cargos estruturais da empresa se transformou em um método recorrente das empresas para reduzir seus custos e dispor de mão de obra barata”, diz.
Panorama desfavorável
Mesmo com as diretrizes de estágio, a estudante de jornalismo Maria Valerón, da Universidad Carlos III, expõe que a situação laboral permanece complicada. Segundo ela, os estagiários costumam trabalhar gratuitamente para conseguir experiência e isso se estende mesmo depois de formado: “Muitos jornalistas passam os primeiros anos de sua carreira trabalhando de graça para algum meio de comunicação”.
Miquel Andreu, jornalista formado em Barcelona, acrescenta que a situação está cada vez pior: “A crise econômica que estamos sofrendo desde 2008 está causando demissões em massa de trabalhadores, o fechamento dos meios de comunicação, reduzindo salários e direitos, etc. Isso faz com que o que tenha um trabalho se torne um sortudo”.
Segundo o Informe Anual da Profissão Jornalística, editado pela Associação da Imprensa de Madri (APM), em 2011 o setor teve um aumento de 78% no número de desempregados, se comparado com 2010. Atualmente, quase 10 mil jornalistas não encontram emprego, o que resulta em um panorama assustador: apenas um em cada dois licenciados em jornalismo encontra trabalho.
Pilar Perales, aluna de jornalismo da Universidad Carlos III, aponta que a situação não é nada favorável: “Você se vê no quarto ano da faculdade, sem nenhum estágio feito e a ponto de sair para um mercado laboral praticamente inexistente quanto às ofertas e supersaturado em demanda”. Celia Becerra, da mesma universidade, concorda. “É muito duro e a maioria de nós, infelizmente, acaba se desmotivando com o trabalho. Esperemos que a situação melhore”.
Referências
AGUADED, José e TIRADO, Ramón. La situación en el mercado de trabajo de los titulados en el ámbito de la comunicación. Universidad de Huelva, 2003. Disponível em: ww.educaweb.com/esp/servicios/monografico/comunicacion/103670.asp
CARO, Francisco e JIMÉNEZ, Gloria. Periodistas: El acceso al mercado laboral. Universidad de Sevilla, 2006. Disponível em: http://grupo.us.es/grehcco/ambitos%2015/15caro.pdf
FARIAS, Pedro (org.). Informe Anual de la Profesión Periodística Associacion de la Prensa de Madrid. Madrid, 2011
VIDELA, José Juan. La formación de los periodistas en España: perspectiva histórica y propuestas de futuro. Madrid: Universidad Complutense de Madrid, 2004. Disponível em: http://eprints.ucm.es/tesis/inf/ucm-t25979.pdf
Criterios de la FeSP sobre las prácticas de los estudiantes en la empresas. Federación de Sindicatos de Periodistas-FeSP, 2004. Disponível em: http://www.fesp.org/docs/FeSP-Practicas.pdf
Propuesta de diez puntos para armonizar las Prácticas Externas de los alumnos de las Facultades de Ciencias de la Comunicación y de la Información. Bellaterra (Cerdanyola del Vallès), 2003. Disponível em: http://www.sindicat.org/spc/docum/uploads/RA%20propuesta%20diez%20puntos%20armonizar%20practicas%20periodismo.pdf
Comentarios de la Federación de Sindicatos de Periodistas (FeSP) a la Propuesta de
Diez puntos para armonizar las Prácticas Externas de los alumnos de las Facultades de Ciencias de la Comunicación y de la Información aprobada por la Conferencia de Decanos.Junta Ejecutiva de la FeSP, 2004. Disponível em: http://www.fesp.org/docs/DocumentoDecanosConComentarios.pdf
Becarios: masivo fraude de ley. Sindicato de Periodistas de Madrid, 2004. Disponível em: http://www.fesp.org/docs/estudiants.pdf